Da ligação à natureza ao desporto é preciso repensar a educação
As crianças de hoje são, desde pequenas, muito estimuladas cognitivamente. Gostam de brincar e organizam muito bem os seus tempos de lazer, mas são induzidas pela sociedade para o sucesso. Impõe-se refletir sobre o que consideramos ser o sucesso, o bem-estar e o lazer. Foi com esta primeira reflexão, feita por Aida Figueiredo, docente do Departamento de Educação e Psicologia da Universidade de Aveiro, que arrancou o painel “Desporto e Lazer na Educação”, do colóquio realizado ontem pelo CASPAE - Centro de Apoio Social de Pais e Amigos da Escola.
A comemorar até maio de 2025 os seus 25 anos de atividade, a IPSS de Coimbra decidiu realizar este e ainda mais dois colóquios, abrangendo os seus três pilares de atuação: a educação, desporto e educação ambiental; a educação tecnológica, como ferramenta de inclusão; e as atividades de tempos livres, que estão na sua génese.
Na sessão de abertura do colóquio de ontem, realizado no auditório do ISCAC, a presidente da direção do CASPAE, Emília Bigotte de Almeida, realçou o formato escolhido para esta iniciativa, com a gravação de um vídeo síntese das intervenções a ser difundida em espaços digitais, «promovendo um diálogo contínuo e ampliando o impacto das ideias debatidas». «Fortalecer a comunidade educativa» e «impulsionar mudanças» são dois dos objetivos, com a troca de ideias entre especialistas, educadores, pais e gestores, a permitir que «políticas e práticas sejam continuamente ajustadas às necessidades reais das crianças».
O percurso escolar está moldado para aquisições cognitivas e o cumprimento de conteúdos programáticos
Na primeira mesa, moderada por Lídia Pereira, foi consensual a ideia de que é preciso repensar a educação, promovendo uma maior ligação e respeito pela natureza e uma maior valorização do desporto e da prática física. Rui Mendes, docente da Escola Superior de Educação de Coimbra, reparou que todo o percurso escolar está moldado para aquisições cognitivas e o cumprimento de conteúdos programáticos.
O coordenador do mestrado em Jogo e Motricidade na Infância e da pós-graduação em Atividade Física e Brincar da ESEC, lembrou que a atividade física é ainda pouco valorizada pela população e que o brincar e o jogar «ainda não foram assumidos como relevantes para o desenvolvimento da nossa sociedade».
Teresa Pessoa, da Faculdade de Psicologia e Ciências de Educação da Universidade de Coimbra, acredita que «ainda podemos dar a volta» ao modelo de escola atual, juntando às «ferramentas essenciais» o trabalho na componente das «expressões» - «antes de saber escrever, a criança deve saber tocar, cheirar, movimentar-se» - e promovendo a relação com a natureza. Esta «obriga-nos a parar», a enfrentar obstáculos, a «treinar a frustração», disse.
Respeitar o ambiente: de mil para zero carrinhos, na Latada e no rio
Num testemunho pessoal, Fernando Paiva (“Joca”), do movimento ambientalista “Não Lixes” , explicou como é que «a paixão de andar sobre a água com uma prancha» o fez assumir um papel na defesa da natureza (ver caixa). Para o ativista, respeitar o ambiente é respeitar a nossa casa e todos os que nela moram. «Nas minhas aulas de surf, os mais fracos são ajudados pelos mais fortes» e a integração também se faz a apanhar o lixo da praia, concretizou.
Em 2013, “Joca” e um grupo de amigos retiraram do Mondego e das suas margens mais de 200 carrinhos de supermercado, abandonados pelos estudantes depois do cortejo da latada. Em 2017, o movimento “Não Lixes” fez um cordão humano junto ao rio e em anos seguintes chegou a reunir mais de mil carrinhos no Largo da Portagem. Contando com o empenho do atual executivo municipal, da polícia e dos hipermercados, Joca falou ontem do «milagre» deste ano, com o desfile a terminar sem carrinhos no rio ou margens.
Iniciação à programação está em todas as escolas do município
A educação tecnológica é um dos temas a abordar nos colóquios de aniversário do CASPAE e, entre o trabalho realizado nesta área, Ricardo Almeida, técnico superior de Educação Social, destaca o projeto All In Code, que visa combater a desigualdade de acesso dos alunos a tecnologias.
O coordenador do projeto revela que o CASPAE tem levado atividades na área tecnológica às escolas de 1.º ciclo ao longo dos últimos 10 anos e que, mais recentemente e com o apoio do Município, o All in Code está a fazer iniciação à programação em todas as turmas do 4.º ano das escolas do 1.º Ciclo de Coimbra. «Conseguimos neste momento apoiar mais de mil crianças», revelou ontem ao nosso jornal.
A comemorar 25 anos, o CASPAE é hoje, nas palavras da presidente Emília Bigotte, «uma instituição de referência em Coimbra, a nível nacional e também internacional, já que desenvolve projetos internacionais e com parceiros europeus».
«A nossa atividade abrange deste a infância à idade sénior, da saúde à educação e ao apoio domiciliário, a nossa rede é muito grande e só conseguimos fazer este percurso de 25 anos com os nossos parceiros e clientes, que têm acreditado na instituição. Temos de agradecer a quem a fundou e trouxe até aqui, numa história de muitos desafios e, sobretudo, de compromisso com a sociedade», declarou.