Festival Caminhos do Cinema começa hoje com homenagem a Luís Miguel Cintra
Diário de Coimbra O Festival Caminhos do Cinema Português está a celebrar 30 anos de existência. Quais são os destaques da programação?
Tiago Santos Habitualmente, fazemos uma convocatória em janeiro. Enquanto estão a decorrer as inscrições vamos avaliando aquilo que nos vai chegando e procuramos fazer, sobretudo, uma avaliação qualitativa dos filmes e perceber se correspondem aos trâmites estéticos e artísticos que nos permitem aferir que podem ser programáveis no festival. Fechado o período de inscrições, iniciamos uma seleção dos filmes e articulamos da melhor forma as temáticas dos filmes para pôr a programação a dialogar. Este ano, um dos grandes destaques é a representação do 25 de Abril, mas também temos a identidade de género, o direito à autodeterminação dos povos, nomeadamente nas ex-colónias portuguesas, no fundo, temas que são transversais à nossa cultura, porque a programação do Festival é sempre um reflexo do contemporâneo. Quando olhamos para o “On Falling”, por exemplo, reparamos em vários temas transversais à juventude, como a precariedade, a emigração forçada… A nossa taxa de seleção é de 20% para filmes portugueses, porque temos tido cada vez mais produções. É um festival muito exigente de entrar e pauta por uma grande qualidade e, este ano, conseguimos pela primeira vez ter representados os principais filmes que passaram pelo circuito internacional de festivais, desde logo, o “On Falling”, “Grand Tour”, “Banzo”.
DC O festival tem extrapolado a cidade e chegado a outros concelhos. Qual é o desafio de programar fora da cidade?
TS Os Caminhos do Cinema Português vem procurando aproximar-se dos públicos e dado que é cada vez mais difícil mobilizar públicos para dentro do evento temos de ir ao encontro de outros públicos. É mais fácil o festival ir até à Mealhada, Figueira da Foz, Penacova do que trazer estes públicos até Coimbra. Esse diálogo com as autarquias foi importante para termos um impacto regional, para que o público possa beneficiar de conhecer o cinema português. O nosso programa educativo não se centra apenas no pré-escolar e 1.º ciclo e procura olhar para todos os ciclos de ensino e esperemos que os professores promovam uma reflexão dentro das salas de aula.
DC Como é que têm sido estas três décadas de Caminhos?
TS Os Caminhos do Cinema Português tiveram génese na Faculdade de Letras. Mais tarde, desafiaram o Centro de Estudos Cinematográficos (CEC) a realizar uma mostra para a exibição dos filmes portugueses aos alunos estrangeiros. Foram feitas três edições e depois houve um interregno entre 1991 e 1997. Quando o festival regressa em 1997 já surge como uma organização do CEC com uma estrutura formal de festival e deixa de ser uma mera mostra de filmes portugueses. E foi aí que se começou a caminhar para o festival mais organizado. A produção portuguesa começou a massificar-se, o que significa que existe cada vez mais produções e isso fez com que deixássemos de ter uma mostra representativa daquilo que nos chegava para começarmos a rejeitar e a selecionar os filmes candidatos.
DC A cada cinco edições do festival, há sempre uma homenagem a uma personalidade ligada ao cinema. Este ano, escolheram Luís Miguel Cintra, porquê?
TS Os critérios não são muito simples, sobretudo porque é o único prémio que o festival atribui [a personalidades]. Aquilo que fizemos em 2019 foi procurar alguém que fosse um consenso no cinema português. Isabel Ruth é um marco extraordinário do novo cinema português e daquilo que representa para os novíssimos realizadores, porque é transversal. O Luís Miguel Cintra surge no mesmo sentido, é uma personalidade que já foi agraciada com o Prémio Universidade de Coimbra e é uma personalidade central da cultura portuguesa no teatro, no cinema, e que não se “vendeu” ao audiovisual. Sempre teve um caráter muito recto tanto no seu papel artístico como de promotor cultural. Ele é efetivamente um marco no cinema português e, por isso, deve ser homenageado e distinguido.
DC A Casa do Cinema de Coimbra é uma das vossas “casas” e irá sofrer em breve algumas obras. Quais são as expectativas?
TS O projeto vai tornar aquilo que são as condições de conforto da sala ao nível das exigências do contemporâneo. O que se espera é um isolamento acústico, a climatização, melhores condições de combate a incêndios... As obras são muito desejadas neste sentido, principalmente devido ao ruído das frações vizinhas que nos perturbam.
DC O trabalho do Caminhos vai além destes seis dias de festival. Qual é o trabalho que fazem no resto do ano?
Nós procuramos fora do festival trazer ações que podem fortalecer ainda mais o festival. Dentro desta programação temos três ações fora da sala de cinema, uma Masterclass com profissionais do setor; um simpósio que chama “Fusões do cinema” e o programa Incentivar para incentivar novos projetos cinematográficos na região. Durante o ano, existe um papel fundamental da Casa do Cinema de Coimbra que faz um complemento muito importante ao termos uma programação mais vasta de filmes portugueses. No fundo, vamos criando “ecos” do festival ao longo do ano, mas o festival é uma altura do ano em que apenas numa semana conseguimos ter uma perspetiva global da produção de cinema português, conhecer os realizadores, atores, produtores e poder “saltar” o salto de espectador a participante e é aí que o festival é uma oportunidade única.