Pediatras portugueses reportam casos de pneumonia provavelmente causadas por tabaco aquecido
Pediatras portugueses estão a tratar crianças com pneumonias inflamatórias graves, suspeitando que a causa seja a exposição ao tabaco aquecido, alertou Carolina Constant, do Grupo de Trabalho para o Controle de Exposição ao Tabagismo da Sociedade Portuguesa de Pediatria.
“Nós, pediatras, já estamos a tratar crianças com pneumonias inflamatórias graves, provavelmente, resultantes da agressão do tabaco aquecido", sublinha a pediatra Carolina Constant numa nota enviada à agência Lusa, na véspera do Dia Nacional do Não Fumador.
Carolina Constant salienta que, "apesar da proibição da venda de tabaco e nicotina a menores, os jovens facilmente têm acesso a estes produtos, experimentando-os numa idade precoce, em que os seus pulmões ainda estão em desenvolvimento e são mais vulneráveis à exposição dos tóxicos do tabaco e dos ‘vapes’ [cigarros eletrónicos]”.
Além disso, alerta a pediatra, a nicotina prejudica o desenvolvimento cerebral das crianças, afeta o rendimento escolar e cognitivo, e é um fator de risco para alterações comportamentais e de saúde mental, além de uma escalada rápida para a dependência, inclusive para outros consumos.
“Por isso, é urgente proteger as crianças e as gerações futuras através de medidas eficazes como as propostas legislativas do Reino Unido”, defendeu Carolina Constant.
O governo do Reino Unido anunciou novas medidas legislativas, que irão entrar em vigor em 2025, no âmbito da Lei do Tabaco e dos Vaporizadores, entre as quais a proibição da venda de vaporizadores descartáveis para combater o consumo crescente entre os jovens e os problemas ambientais.
Também serão expandidas as proibições de fumar em ambientes fechados e em espaços exteriores, incluindo áreas onde estão presentes crianças e populações vulneráveis, como escolas, parques infantis e hospitais, e será alargada as zonas livres de fumo existentes para incluir restrições de ‘vaping’.
Hilson Cunha Filho, da Confederação Portuguesa de Prevenção do Tabagismo, também destacou, em declarações à Lusa, a importância destas medidas, defendendo que deviam ser seguidas em Portugal.
“Os formuladores de políticas públicas devem desnormalizar sempre que possível qualquer uso de um produto não saudável”, como é o tabaco e seus derivados de nicotina, disse o investigador.
No seu entender, não há “outro caminho alternativo que possa ser seguido pelos países que viram, durante todo o século XX, as suas populações devastadas pelo consumo de tabaco, enquanto a indústria do tabaco crescia e dominava os mercados e influenciava sociedades e governos”.
Para Hilson Cunha Filho, os governantes devem regular “as atividades das indústrias prejudiciais à saúde, limitar a oferta e mesmo impedir que os seus cidadãos possam, inadvertidamente ou de forma manipulada, ter acesso a produtos nocivos que podem afetar gravemente a sua saúde ao longo da sua vida”.
“A saúde dos cidadãos é um direito universal inalienável que deve ser protegido pelo Estado, como outros direitos universais” e, por isso, “está mais do que na hora de proteger os cidadãos, seja no reino Unido ou em Portugal”, sustentou.
O investigador disse ter ainda “alguma esperança de um dia ver os políticos portugueses perceberem que não basta se lamentarem por ter uma população doente e sem serviços de saúde que consigam responder a essa calamidade [tabagismo], e que é preciso atuarem em prol da proteção da saúde e uma prevenção eficaz”.