
Crianças serão “Heróis” contra doenças do sangue
“Heróis da Lua Crescente” é uma iniciativa criada pela Associação Portuguesa de Pais e Doentes com Hemoglobinopatias (APPDH) que visa ajudar crianças, jovens e adultos com doenças ligadas ao sangue (hemoglobinopatias).
Com criação que data de há 30 anos em Almada, Lisboa, a APPDH estende-se atualmente por todo o país com a missão de apoiar todas as crianças e jovens que sofrem com diferentes patologias genéticas que causam alterações nos glóbulos vermelhos. Neste trabalho, o foco será a drepanocitose, que altera a configuração dos glóbulos vermelhos de redondos e maleáveis para rígidos e em forma de “lua crescente”, causando vários problemas, como crises de dores, consideradas as mais dolorosas de todas (superiores a dores de parto).
Esta doença, considerada rara, tem uma taxa de diagnóstico muito alta, mas pouca informação disponível. Apenas em 2022, e após muita insistência da APPDH, a comunidade médica juntou a drepanocitose à lista de doenças avaliadas no “Teste do Pezinho”.
Doença hereditária
Esta patologia é hereditária e tem uma forte expressão em países de climas tropicais, onde a grande maioria dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) se inserem. Esta hemoglobinopatia apenas se manifesta se ambos os pais forem portadores do gene relativo à patologia. Segundo a explicação apresentada, os portadores de apenas um gene «não só não têm a doença, como tem alguma proteção contra casos severos de malária», o que, ao longo do tempo, tornou este traço genético mais prevalecente nos países tropicais, onde existe malária.
“Não queremos que estes jovens percam a esperança, queremos ajudá-los a não estarem presos aos negativos da doença”
Objetivos definidos
“Heróis da Lua Crescente” foi candidato ao programa Portugal Inovação Social, com a finalidade de angariar financiamento para as suas atividades, conseguindo 111 mil euros de apoio, através de investidores sociais - BPI - Fundação “la Caixa”, Pfizer, Booksfactory e União de Freguesias de Coimbra. O objetivo será financiar as iniciativas, desenroladas ao longo de 18 meses, que promovem um crescimento social e uma chamada de atenção para a doença. Joana Ramos refere que a APPDH quer «oferecer vocabulário para falar sobre a doença» e tornar os participantes mais capazes e livres para a sua vida. «Queremos que sejam os heróis da sua própria história».
Para esta capacitação, estão previstas seis atividades: a realização de um documentário (criado pelos jovens), formação em criação radiofónica, pintura de um mural, artes manuais, duas sessões de desconstrução e entendimento da dor (com intervenções dos participantes a explicar o que sentem) e a criação de brochuras e atividades escolares.
Neste projeto piloto da região centro, que poderá vir a expandir-se ao resto do país, vão participar 25 crianças e jovens com idades entre os seis e os 29 anos. A associação encontra-se em análise de interessados em participar nas atividades.
“O nosso objetivo é melhorar a qualidade de vida destes jovens em, pelo menos, 15%”
PALOP são os mais representados entre os doentes em Portugal
Pelas caraterísticas da doença, os habitantes de Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa representam uma grande percentagem dos doentes com drepanocitose, em Portugal. O processo de migração acaba por complicar o acompanhamento e o estado psicológico dos doentes e familiares pelas dificuldades associadas à imigração. «Por vezes encontramos uma falta de empatia para com quem tem esta patologia», refere Joana Ramos, acrescentando que o facto de ser uma «doença invisível» também causa transtorno e uma complicação para se encontrar “terreno comum” entre pares.
Doença “silenciosa” e “invisível”
Entre as características negativas desta doença, encontramos grandes problemas a nível social e no dia a dia.
A drepanocitose implica um número elevado de visitas ao hospital, para tratamento individualizado. Estas idas ao hospital podem afastar as crianças e jovens da escola por tempo prolongado, prejudicando a sua aprendizagem e relações interpessoais. A escola, por si, é também considerada como um fator “complicado” pois ainda é prejudicada por muita falta de informação
e pela exclusão social, propositada ou não.
Sendo uma “doença invisível” existe uma falta de sensibilidade, conhecimento e empatia para com quem sofre com ela. Uma das razões para isso pode passar pela dificuldade, em idades jovens, de expressar aquilo que se sente. Estes jovens enfrentam, ainda, grandes problemas em analisar e perspetivar o seu futuro, pela ideia de uma possível morte prematura. “Heróis da Lua Crescente” vem tentar reverter esta situação e ensinar os doentes e a população a entender a doença.