"Over the Rainbow"
Nalgum lugar, além
do arco-íris, os céus
são azuis
E os sonhos que ousares
sonhar vão-se
tornar realidade
A música é hoje símbolo de esperança, paz e saudade. Over the Rainbow (original de O Feiticeiro de Oz – 1939, imortalizada por Judy Garland e mais tarde por Israel Kamakawiwoʻole) é um tema apropriado para a época que se aproxima da Páscoa. Enquanto tempo de renovação, renascimento e esperança, convida-nos a refletir sobre a capacidade de mudança pessoal e coletiva. Tal como os personagens de Oz descobrem dentro de si as virtudes que julgavam perdidas, também os cidadãos podem, nesta época, reencontrar o sentido de comunidade, de verdade e de compromisso com o bem comum.
O filme “O Feiticeiro de Oz” (The Wizard of Oz), de 1939, realizado por Victor Fleming e baseado no livro de L. Frank Baum (1930), consolidou-se como um dos pilares da cultura popular ocidental. Mais do que um simples filme infantil, esta obra cinematográfica tornou-se um símbolo de esperança, coragem, crítica social e identidade coletiva.
Mas afinal, o que faz deste conto aparentemente simples uma peça patrimonial de valor universal?
Funciona como metáfora da política moderna. O "poder" frequentemente reside na perceção que se cria, não necessariamente na competência ou substância do indivíduo. No mundo das eleições, seja em Portugal ou nos EUA, esta ilusão é muitas vezes cultivada com estratégias de comunicação, marketing político e retórica emocional. Tal como o Feiticeiro de Oz, certos candidatos ou figuras públicas projetam uma imagem poderosa que mascara uma falta de consistência, preparação ou verdade.
Nos Estados Unidos, Donald Trump tem sido uma figura paradigmática deste fenómeno. Em Portugal, observa-se igualmente a ascensão de figuras políticas que apostam fortemente na comunicação direta com o eleitorado, muitas vezes simplificando discursos e evitando o debate técnico ou ideológico. Como o feiticeiro, estes atores constroem uma narrativa de poder e solução que, na prática, pode revelar-se vazia ou ilusória.
Contudo, “O Feiticeiro de Oz” é também uma história de descoberta interior. Nenhum dos companheiros de Dorothy necessitava realmente da ajuda do feiticeiro: o Espantalho demonstra inteligência ao longo da viagem, o Homem de Lata mostra emoção e empatia, e o Leão age com coragem várias vezes. A mensagem subjacente é que as qualidades que procuramos nos líderes ou em sistemas externos, muitas vezes já existem dentro de nós. Esta é uma lição valiosa para o eleitor: a responsabilidade de participação política, de pensamento crítico e de exigência cidadã reside no próprio indivíduo.
A história de Dorothy relembra ainda a importância da empatia e da cooperação. Não é por acaso que a sua viagem é feita em grupo, com personagens diferentes, cada uma com as suas fragilidades. Esta diversidade, longe de ser um obstáculo, é precisamente a força da caminhada. Num contexto político cada vez mais polarizado e fragmentado, esta é uma chamada de atenção para a necessidade de construção de consensos e de um diálogo mais inclusivo.
Outro valor importante da obra é a importância da verdade. Quando o feiticeiro, todo poderoso, é desmascarado, não há colapso do mundo, mas sim uma oportunidade para reenquadrar as expectativas. A verdade, mesmo quando desconfortável, permite construir relações mais autênticas entre os indivíduos e o poder. A sociedade atual vive numa era de fake news, de deep fakes, de manipulação algorítmica, o que reforça a atualidade desta mensagem. Em tempos eleitorais, a busca pela verdade torna-se um ato de resistência cidadã.
A narrativa de Oz convida-nos a ultrapassar a cortina de fumo dos grandes discursos, a desconfiar dos "feiticeiros" que prometem tudo sem mostrar o que são, e a reconhecer que a verdadeira transformação está dentro de cada cidadão: na sua capacidade de pensar, sentir e agir com coragem. Tal como o Espantalho, o Homem de Lata e o Leão Cobarde, também nós temos as ferramentas para reconstruir a nossa própria Terra de Oz, com mais verdade, empatia e participação cidadã ativa.